Última aula. Pensava que o dia havia sido relativamente calmo. Naquele momento, por volta das 18h, ela estava sentada na cadeira pela primeira vez no dia, os alunos desenhando os perigos de uma viagem durante as Grandes Navegações. Diversão e descanso garantidos por pelo menos 20 minutos.
Mas não estava sentada apenas pensando. Ao longo dos anos aprendeu a pensar, observar e ainda escrever, anotar o que fosse necessário na burocrática rotina educacional, tudo ao mesmo tempo. A porta aberta, brisa fresca na tarde abafada. Alunos entretidos, silêncio. Pensando que não precisava observá-los tanto, resolve adiantar as anotações, que não são poucas.
Por quase um segundo, nota que está sendo observada. Seria comum se o observador estivesse na sua frente, sentado nas carteiras, mas não estava. Ele estava à porta, parado, olhando.
E por um pouco mais que um segundo, ela o observa também, tentando lembrar de onde conhece aquele homem alto, claro, de olhos verdes. De volta à realidade, levanta-se e vai até ele. Está tendo reunião de pais na escola, ele deve ter vindo ver o filho, ou levá-lo embora.
- Boa tarde, professora, sou o pai da Maria. Acabei de sair da reunião, posso levá-la pra casa?
- Sim, claro, pai. Mas hoje é o primeiro dia de aula aqui, quem é a sua filha mesmo?
Disse isso olhando pra sala, sabia mais ou menos onde a garota estaria, a sala foi organizada por ordem alfabética. A garota imediatamente começou a organizar o material.
- Professora, você freqüentava a Sunshine, não? Será que ainda lembra de mim?
Por um momento ela olha fixamente para aquele homem. Seus olhos! Ali de perto, lembra-se de quando os via de mais perto ainda, em ângulos diferentes daquele. E lembra do seu cheiro, e das tardes de domingo esticadas até o anoitecer, na velha praça.
- Sim... lembro de você. Mas e aí, que mundinho... o que você fez da sua vida?
- Casei com a Bete, que conheci lá também, lembra? Temos dois filhos, a Maria é a mais velha. E você, casou?
- Não. Continuo saindo pra dançar. (Risos)
A garota chegou até a porta, pegou na mão da pai.
- Obrigado professora. Até mais.
Ela ficou observando da porta, com as mãos nos bolsos do avental. Eles estavam prestes a cruzar o portão ela ainda o viu olhando para trás, sem que a filha notasse. Virou-se para a sala. Pediu que começassem a guardar o material. Pensou mais uma vez ainda, que mundinho pequeno. Sentiu uma vontade quase incontrolável de sorrir, feliz com o rumo que sua vida tomou.
20.2.08
O Pai
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Um comentário:
Olha só, foi impressão ou você poderia ser a mãe da Maria? rss
Bem-Vinda ao vício do Blogger!
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