31.10.10

Um dos homens da minha vida

Hoje faz 8 dias que acordei sem o meu pai. Eu acordei, ele não. Estranho pensar que eu nunca tinha considerado a possibilidade de um dia ficar sem ele, embora desde que eu me conheça por gente sua saúde nunca tenha sido das melhores. Tabagista desde sempre e sedentário, sabíamos que ele tinha problemas de saúde.

Mas ele era meu porto seguro em casa. Era um companheirismo velado, algo não declarado. Mas o fato é que ele nunca tomou partido nos meus inúmeros conflitos com a minha mãe. Essa sim, sempre foi uma relação conturbada por incompatibilidade de interesses, pensamentos, opiniões. Nos piores momentos, o máximo que ele fazia era permanecer neutro. Nunca me criticou por nada que fiz, nunca me repreendeu. Orgulhou-se quando saí do colégio e fui fazer faculdade direto. Lembro até hoje do dia em que meu nome saiu no jornal, na lista dos aprovados no vestibular, e ele me acordou com o jornal nas mãos. O dia em que fui aprovada no concurso pra ser professora também foi uma festa, menor somente do que o dia em que assumi meu cargo e consolidei minha carreira. O sucesso da minha cirurgia também foi noticiado por ele por todo o bairro, exibindo-se pelo fato de agora ter uma filha mais bonita ainda. Cada vizinho que confirmava isso, ele vinha e contava.

Momentos felizes da infância também. Passeios e mais passeios, longos domingos rodando pelas estradas de terra que não davam em lugar nenhum. Domingos fazendo churrasco no clube e fugindo da chuva da tarde. Viagens, passeios, filmes na TV, no video.

Não é porque ele foi embora que digo isso tudo, nossa ligação era clara, óbvia. Embora não compartilhássemos das mesmas opiniões em tudo, nos respeitávamos. Em política nunca concordamos, mas sei que ele se orgulhava das minhas opiniões e foi com ele que aprendi a assistir jornais e criticá-los, desde muito cedo.

Acho mesmo que vamos nos encontrar, não é possível que acabe aqui, assim. Pena que parece que vai demorar agora. O que me conforta, e muito, é tudo isso que acabei de escrever. Entre milhões de abraços de pessoas conhecidas, amigas e desconhecidos, uma frase foi a que mais me tocou e a que eu talvez nunca me esqueça. "No final, só ficam as boas recordações, as lembranças boas". Quem me disse isso foi ele, o namorado, o jornalista, ou o fotógrafo. A pessoa sem a qual eu simplesmente não sei como teria sido passar daquele sábado até hoje, um outro homem da minha vida.

19.10.10

5 meses

Saúde física x saúde mental

Hoje faço 5 meses de cirurgia. Inegável o ganho de saúde física. Operei com 96kg, mas cheguei a pesar 107kg. Hoje, com 76kg, não sinto mais cansaço, dor nos pés, dor no corpo, falta de ar. Estou comendo menos e melhor, pouco me satisfaz e aprendi comer bem. A pressão baixou também, embora nunca tenha sido alta, e até os exames ginecológicos vieram sem nenhuma alteração. Se tem a ver, acredito que não, mas é só mais um exemplo de que nunca estive tão bem de saúde em toda a minha vida. Até a infecção de urina que eu tinha praticamente durante todo o tempo me livrou. Hoje consigo fazer quase duas horas de academia e não chego em casa morrendo, nem tenho que parar por causa da falta de ar.

Mas parece que tudo tem um preço, e esse tá sendo bem alto. Não falo das guloseimas que hoje me fazem mal. Falo da minha cabeça, dos meus pensamentos, das minhas angústias, essas sim estão me fazendo mal de verdade.

Minha auto estima nunca foi tão baixa, nem na época em que pesei 107kg, pelo contrário, até me achava bem interessante. Estranho como antes eu não sentia tanto a necessidade de elogios, e hoje, mesmo os tendo esporadicamente, não me bastam. Nunca basta, nada basta. Poucas coisas ou quase nada me traz satisfação. Tenho a impressão que começo a perder o prazer de fazer várias coisas, e nem comprar roupas mais me atrai. Vontades eu tenho várias. Vontade mesmo de comprar roupas, sapatos, fazer tatuagens, mudar drasticamente o cabelo, sumir do trabalho, vender o carro e gastar todo o dinheiro em inutilidades, viajar, passear. Mas é óbvio que não faço absolutamente nada disso pela falta de grana e coragem.

Mas o que mais dói mesmo é a falta da auto estima, a impressão de que estou tanto quanto ou mais gorda do que antes. A sensação de que nunca vou ser vista como alguém magra, desejável. Junto com as neuras quanto ao corpo é inevitável que sujam outras neuras, como a sensação de que gostaria de ter mais atenção das pessoas, ou de que apenas enche o saco de todos, e que todos podem realmente estar de saco cheio de você. Penso às vezes que talvez o desejo de aceitação tenha ajudado muito na minha decisão pela cirurgia, mas que passando o tempo, meu corpo mudou, não meus defeitos. Talvez eu continue chata, carente, grudenta e na verdade, solitária, sem lá muitos amigos e amigas, sem muitos ombros onde eu possa chorar tudo isso. Solitária, acho que é assim que hoje estou me sentindo.

Balanço final? Não sei.  A razão diz que é positivo. Mas tenho saudade de me sentir bem.



Música linda, do Itamar Assumpção e Alice Ruiz, cantada pela Zélia Duncan e Anelis Assumpção. Hoje ela me faz bem.